quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Passeando com as elétricas mineiras

No trecho entre Barra Mansa e Passa Vinte. Subindo e serpenteando as montanhas, nota-se o aspecto da linha eletrificada, ornada com seus rústicos postes de eucalipto, a exemplo dos usados pela Companhia Paulista.

Quando nós ouvimos falar de locomotivas elétricas no Brasil, a primeira que vêm em nossas mentes, quase unanimemente, são as célebres "V8" da Companhia Paulista - Ou as Escandalosas, por serem do mesmo modelo -, com seu design charmoso e imponente. Indo mais a fundo, lembramos de outras máquinas da Paulista, ou das Lobas e Minissaias da Sorocabana, das Henschel cariocas, etc. Já falei de boa parte delas, por serem muito famosas no Rio de Janeiro e em São Paulo. Agora, é a vez de falar das simpáticas, pitorescas e não menos importantes elétricas da Rêde Mineira de Viação.

Metropolitan-Vickers de 1928, em duplex, com vagões de transporte de gado.

As primeiras elétricas de Minas foram adquiridas pela E. F. Oeste de Minas, ferrovia famosa por seu trecho de "bitolinha" (em 76cm), mas que contou com uma longa rede em bitola métrica chegando até o porto de Angra dos Reis, no Rio de Janeiro. Eram cinco máquinas, fabricadas pela Metropolitan-Vickers, e trabalhavam no primeiro trecho eletrificado da linha, aliás o mais difícil, entre Barra Mansa e Augusto Pestana. Pequenas, pesavam 46 toneladas e produziam 600HP de potência, e puxavam trens de até 200 toneladas, ou se postas em duplex, podiam rebocar até 300. Parece pouco, mas as condições da via eram tão difíceis que as máquinas a vapor puxavam uma carga pouco maior que seu próprio peso. Utilizavam alimentação de 1500 Volts, metade do padrão nacional utilizado pela Paulista, Central e Sorocabana. 

Duplex de Metropolitan-Vickers em Rutilo.

Inauguraram a eletrificação da Oeste de Minas em 1928, data próxima da entrega do exemplar da Metropolitan-Vickers da Companhia Paulista, o que se supõe que a mesma estava animada com suas vendas à ferrovia mineira e resolveu tentar a sorte na estrada de ferro que àquela altura já estava com sua eletrificação consolidada e em plena expansão. Não deu certo, como já mencionado nesse blog algum tempo atrás, pois a Paulista só ficou com aquele exemplar.


Acima e abaixo: duas raras fotos mostrando a frente das Metropolitan-Vickers. Antigas, são difíceis de se ter registros fotográficos das mesmas, sendo a imagem de cima retirada do catálogo do fabricante.


No ano da inauguração. Essa foto é anterior ao período da inauguração, que ocorreu apenas em Dezembro de 1928.

Tempos depois, a Oeste de Minas, em grave crise financeira, acabou sendo englobada à Rêde Mineira de Viação, sob controle do Estado de Minas. Pouco tempo depois, fez nova aquisição de locomotivas elétricas, animada com a eficiência das mesmas, e querendo aumentar seu parque de tração, umas vez que a eletrificação se estendeu - chegou em seu apogeu até a localidade de Minduri -, e precisava suprir a demanda. Dessa vez o fornecimento ficou a cargo da dupla alemã Siemens (parte elétrica) e Schwartzkopf (mecânica e carroceria). 

Perfil da pequena Siemens, no catálogo do fabricante.

Chegaram em 1934, em oito unidades. Pesavam 48 toneladas, apenas duas a mais que suas antecessoras, embora desenvolvessem 800HP. O baixo peso era resultado do processo de montagem por solda elétrica, ao invés de rebites, processo que seria usado posteriormente nas Lobas para também reduzir o peso, o que era essencial nas vias precárias nas quais trafegavam.

Siemens em Minduri.

Em Zelinda.

Na oficina.

O terceiro e último modelo é um projeto à parte, pois se tratava de uma aquisição de outro trecho eletrificado da RMV, entre Belo Horizonte e Divinópolis. Iniciado no pós-Segunda Guerra, esse trecho era algo novo, um projeto próprio da RMV, e não algo "herdado" como o antigo trecho da EFOM. O modelo adquirido trabalharia no já consolidado padrão de 3000 Volts, algo mais moderno e eficiente que as outras locomotivas mais antigas. Porém, mais uma vez entrava em cena a Metropolitan-Vickers, fornecendo catorze exemplares daquelas que seriam as mais famosas elétricas de Minas. Tinham potência de 900HP e quase 50 toneladas de peso, o que na prática pouco acrescentava em relação às outras elétricas mineiras. Chegaram em 1952, período de mudanças no mundo ferroviário nacional, pois era a época da chegada gradual das primeiras locomotivas a diesel. Desde cedo as novas Vickers tiveram de conviver com suas ferrenhas e letais concorrentes, embora convivessem em harmonia e até mesmo puxassem composições juntas em certos casos.

As novas Metropolitan-Vickers da RMV.

Em Lavras, já com a pintura da RFFSA.



Durante os anos 70 houve a crise do sistema de 1500 V. Nessa época ambos os sistemas se encontravam em Minduri, exigindo a troca de máquinas ali. As antigas Metropolitan-Vickers de 1928 tiveram de sair de cena por estarem impossibilitadas de trabalhar mais, devido ao desleixo na manutenção durante anos, e as Siemens estavam pouco melhores. Chegou-se à emergência de converter quatro unidades das novas Metropolitan-Vickers para 1500 Volts, até que em meados da década unificou-se todo o sistema em 3000 Volts, de Belo Horizonte até Barra Mansa. Assim as Siemens também saíram de cena. Porém um trecho tão grande para apenas 14 máquinas já era um sinal ruim no cenário elétrico da Rede. Cerca de uma década depois, durante os anos 80, a eletrificação de todo o trecho foi desativado, e as máquinas enviadas para a Bahia, onde encontraram seu fim. Ao menos existem dois exemplares inteiros dessas últimas máquinas, um em São João del Rey, outro em Curitiba, onde algumas máquinas idênticas foram adquiridas num malfadado projeto de eletrificação da Serra do Mar até Paranaguá.

Raridade em relação à história ferroviária nacional, aliás, uma agradável raridade...

Siemens na oficina.

Composição de transporte de gado na Serra da Mantiqueira.

Siemens já com pintura da RFFSA

Triplex com Metropolitan-Vickers e G12. Era possível utilizar as trações elétrica e diesel na mesma composição, sendo notado várias vezes nas linhas da RMV.

Em Glicério, Quatis - Rio de Janeiro.










2 comentários:

  1. Bela matéria. Um excelente trabalho. Parabéns.
    Um abraço.
    Afonso Busembai.

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    1. Fico feliz que tenha gostado, obrigado pelo apoio, Sr. Busembai.

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