terça-feira, 17 de setembro de 2013

Ferrovias "apertadas" V - Aspectos dos ramais em bitola métrica da Companhia Paulista

Nessa bela foto, a famosa Henschel "Jibóia" posa descansando em frente à estação de Brotas.

Embora muitas ferrovias abertas com investimentos relativamente modestos acabassem "inchando" e se tornando ferrovias de primeira linha aos moldes brasileiros, a ideia principal de engenharia das mesmas era que fossem linhas de baixa densidade de tráfego, em geral ferrovias alimentadoras de outras maiores, ou linhas que futuramente seriam investidas. Nessa questão, a Companhia Paulista era bem servida desse tipo de modal, tendo boa parte de sua carga provinda dessas pequenas ferrovias "cata-café".

Por conta da incompatibilidade de bitolas, as cargas deviam fazer baldeação, ou seja, serem completamente retiradas de um trem e passadas para outro. Os pátios possuíam linhas de bitola mista, como na foto.

Ao falar da CPEF, a primeira coisa que nos vêm à mente são as grandes locomotivas elétricas, especialmente as "V8" dos anos 40, que cortavam o interior paulista puxando velozes e luxuosos trens de passageiros pelas linhas da bitola larga de 1,60 m. Porém, para a estrutura econômica geral da Paulista, era de grande importância suas linhas secundárias de bitola métrica. A criação das mesmas se deu geralmente por dois fatores: através de companhias independentes que se utilizavam da Companhia Paulista para se conectar com o litoral, ou por extensões econômicas da própria Paulista.

Vagões na estação Bariri.

O primeiro caso era o mais comum, sendo que por diversos fatores, essas mesmas companhias acabavam sendo posteriormente absorvidas pela Paulista, fosse por vantagem econômica, ou por necessidades estratégicas. O caso mais importante foi o da Companhia Rio Claro, que através de sua absorvição mediante uma interessante manobra comercial, adicionou à CPEF uma notável rede em bitola métrica, da qual parte da mesma foi alargada e adicionada como linha-tronco, de Rio Claro até Itirapina, a partir daí se bifurcando para São Carlos ou Bauru, sendo essa segunda também resultado do alargamento de bitola. Outra ferrovia importante absorvida pela Paulista foi a Companhia do Dourado. Essa não teve trechos alargados, tendo continuado a servir como linha secundária e alimentadora da CPEF.

Locomotiva da antiga Companhia Douradense.

Mais duas locomotivas ex-Douradense.

Em seu apogeu, a Paulista teve a seguinte lista de ramais em bitola métrica:

Ramal de Analândia
Ramal de Campos Sales
Ramal de Agudos
Ramal de Água Vermelha
Ramal de Pontal
Ramal de Jaboticabal
Ramal de Terra Roxa
Ramal de Ribeirão Bonito
Ramal de Nova Granada
Ramal de Barra Bonita (ex-Estrada de Ferro Barra Bonita)
Ramal de Luzitânia
Ramal de Itápolis
Ramal de Bariri
Ramal de Jaudourado
Ramal de Dourado

(Os 4 últimos pertenciam à antiga Companhia do Dourado).

Uma das três "Jibóias", locomotivas de rodagem 4-10-2 adquiridas da Alemanha em 1936.


Fotos do acervo do material rodante da Companhia Paulista, mostrando de perfil uma Henschel "Jibóia", e abaixo uma das duas enormes "Mallets".



Esse grande número de ramais em bitola métrica ajudavam a formar o aspecto "em leque" da rede de linhas da Companhia Paulista, cujo quilômetro zero estava em Jundiaí. Embora fossem de aspecto mais modesto que as linhas principais em bitola larga, esses ramais não estavam de fora do esmero da empresa, que atendia tanto no transporte de cargas quanto de passageiros. Havia também investimentos em material rodante, com vagões feitos em Rio Claro, assim como os da bitola larga, e máquinas compradas exclusivamente para elas, como o caso das famosas Jibóias, e as duas enormes Mallets de rodagem 2-8-8-2, gigantes que por décadas se vangloriaram de ser as maiores locomotivas de bitola de 1 metro existentes, até a chegada das Henschel da Central do Brasil, já no fim da era do vapor. Com o advento das diesel, a CPEF comprou 10 locomotivas ALCo. modelo RSD-8, e 3 máquinas alemãs LEW vieram para bitola métrica.

Imagem em cores de uma das RSD-8.

Um trem de passageiros em bitola métrica parado na estação de São Carlos, para fazer baldeação de passageiros.

Infelizmente, a partir da segunda metade do século XX, o modal ferroviário foi afetado seriamente por decisões governamentais, que prezavam pelo investimento em estradas de rodagem, além do gradual encampamento das ferrovias pelo governo. Uma das medidas sem muito sentido prático do governo foi a denominada "política de erradicação de ramais deficitários", que previa cinicamente enxugar a malha ferroviária, e a Paulista, já nas mãos do governo estadual de São Paulo, se viu obrigada a abrir mão de ramais que, embora não fossem deficitários, eram os menos lucrativos. E assim, a contragosto, mas já sofrendo da paralisia burocrática da estatização, a administração da Companhia Paulista decreta o fim de suas linhas em bitola métrica no decorrer da década de 1960.

Foto com a RSD-8.

Estação de Boa Esperança, com duas RSD-8 manobrando. 

Baldeação na estação de Rincão.

Trem frigorífico em São Carlos, 1918.



8 comentários:

  1. Nha ver as fotinhos é tão legal... dá uma vontade de ter vivido lá... =/ Que chato esse tal de século XXI....

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    1. Bem verdade, antigamente parecia tudo mais tranquilo e menos caótico, hoje em dia não se tem o charme e o pitoresco de outrora...

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  2. Poxa... E eu tenho saudes. Conheci praticamente todas as estações mostradas nestas fotos. Nasci em Bariri. Como meu pai era ferroviário, mudamos para Itapuí. Depois, para Nova Europa, até 1.968 (ano da erradicação do ramal).
    Tenho muitas lembraças. E muitas saudades. Realmente, foi um tempo de ouro.
    Este teu blog foi um achado espetacular. Parabéns.
    Abraços.
    Afonso Busembai.

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    1. Obrigado por compartilhar conosco suas memórias, sr. Afonso Busembai. É triste, mas ao mesmo tempo romântico, a nostalgia que sentimos por uma época que agora está guardada apenas em nossa lembrança, ou fragmentada entre os diversos sítios da internet. Cabe a nós historiadores não deixar morrerem, e além disso, transformar em ferramenta útil - se não prática, ao menos reflexiva - para as gerações posteriores.

      Abraços.

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  3. Matheus, eu é que agradeço este espaço criado por você. Concordo com o fator nostalgia. E realmente, nossas ferrovias, retratam isso. Penso que querem tirar muito lucro, de algo no qual não investiram nada.
    Cabe a nós, cobrarmos, não pela nostalgia mas sim, pela necessidade, a volta dos trens. Hoje, chamados de regionais, intercidades, VLTs... Não interessa o nome, desde que suas funções sejam bem claras e definidas.
    Todos, somos profissionais no que fazemos. E produzimos.
    Falta a classe política, que se julga profissional, fazer a parte dela. E também ser produtiva.Mas, falta também nós, como os maiores interessados, cobra-los.
    Tenho em mente escrever minhas memórias, desde a infância desses hoje 56 anos, viajando, morando, vivendo, respirando, ouvindo e sentindo os sons dos trens. Será uma homenagem aos meus avós e aos meus pais. O tempo está "curto", mas arrumarei um jeito.
    Talvez, isso de pouco valha, pois a cultura ferroviária do brasileiro, principalmente da geração mais nova, parece ser praticamente nula: hoje, o trem atrapalha as cidades. Faz barulho e causa acidentes. Bom, por enquanto deixa pra lá. Assim que arrumar tempo, prometo escrever alguma coisa. Mas, como história, por ter sido de uma família de ferroviários (pobre), ficarei devendo imagens. E hoje penso, quanta falta fazem.
    Muito obrigado e sucesso ao blog.
    Com fé, chegaremos oa objetivo.
    Outro abraço.

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  4. Critérios técnicos e econômicos com relação á escolha da bitola ferroviária.
    Há um consenso entre os especialistas em transporte que a uniformidade de bitola é o fator que mais contribui para a economicidade do êxito comercial de um sistema ferroviário, de carga ou passageiro, e não, a dimensão da bitola, propriamente dita.
    Os operadores metro-ferroviários buscam obstinadamente a movimentação fácil, rápida e confiável do tráfego em suas linhas, independentemente do tipo de bitola utilizado.

    No caso das cinco linhas de metrô existentes em São Paulo, com bitolas diferentes, 1,43 m e a de 1,6 m, em que seja planejada uma alteração na operação e os trens de bitola 1,43 m passem a compartilhar o tráfego na linha de bitola 1,6 m, serão necessárias modificações estruturais importantes. Nesse caso, seria mais adequada a colocação de um trilho interno na via de bitola larga, para estreitar a bitola, transformando, assim, a via de bitola larga em bitola mista. Entretanto, essa transformação é inviável e acarretaria em sérios problemas nas plataformas de embarque e desembarque, uma vez que o trem de bitola 1,43 m não conseguiria entrar nas plataformas existentes da linha de bitola larga, devido á dimensão de sua seção transversal, que é praticamente a mesma do trem de bitola 1,6 m. Além disso, haveria a necessidade de adaptações na captação de energia dos trens de bitola 1,43 m, que pode ser aérea ou por terceiro trilho, é o que ocorre hoje com os trens da linha 5-Lilás não poderão interpenetrar em “Y” com os da linha 2-Verde e nem vice versa na futura integração na estação da Chácara Klabin, pois além da diferença da bitola, largura da carruagem e a forma de alimentação elétrica, linhas-1,2 e 3 terceiro trilho 750 Vcc, linha-5 pantografo catenária 1500 Vcc.

    A proposta de autonomia operacional da linha 4-Amarela e a futura 6-Laranja não invalida sua grande integração com o transporte público existente, já que se conectará diretamente com as linhas 1, 2, 3, 4 e 5 do Metrô e com toda a malha de trens da CPTM.
    Segundo o Metrô SP, a escolha da bitola 1,43 m foi amparada em várias vantagens de natureza construtiva e operacional, como a construção de túneis de menores dimensões, com redução de custos de escavação, sem perda de espaço para todos os sistemas e equipamentos necessários a uma operação eficiente, que seguiram uma tendência consagrada em nível internacional.

    Cabe ressaltar que não há registro de estudos comprobatórios desta tese defendida pelo Metrô de SP quanto à escolha da bitola 1,43 m, principalmente em relação aos custos de construção mais baixos, em comparação com a bitola 1,6 m, além de que o gabarito para construção dos tuneis, e as dimensões das carruagens são exatamente iguais.
    Vale lembrar que há um mito comprovado no setor metro ferroviário que existe material ferroviário em bitola 1,43 m “Em para fornecimento imediato pelos maiores fabricantes mundiais, e que os mesmos já possuem projetos prontos e peças sobressalentes em estoque, para fornecimento imediato”, o que são várias inverdades. Mesmo em bitola 1,43 m, cada projeto de material ferroviário tem especificações próprias, com características construtivas exclusivas e exigências de desempenho distintos.

    Quaisquer fabricantes de material rodante metro ferroviário demoram, acima de um ano para entregar as encomendas, independentemente da bitola.
    Existe experiência brasileira recente comprovada de que essa tese de que não existe material ferroviário 1,43 m em estoque, em função dos cronogramas de entrega dos trens adquiridos para os metrôs de Salvador e São Paulo, que são semelhantes aos cronogramas às aquisições dos trens em bitola de 1,6 m, feitas pela CBTU, para o metrô de Recife, e pela SUPERVIA, para os trens suburbanos do Rio de Janeiro e CPTM de São Paulo.
    Em mercadologia, não existem restrições pelos fabricantes de materiais ferroviários com pedidos em bitolas métrica e larga de 1,6 m sem nenhum sobre preço par que possam justificar estas alegações.
    (continua).

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  5. (continuação)
    Para a escolha da bitola mais adequada para a linha 6-Laranja do Metrô SP.

    Agora que já sabemos do traçado definitivo e as estações de transferência, além da definição do compartilhamento de linhas. Nestes cenários de traçado propostos pelos planejadores, o bom senso indica que há previsão de compartilhamento e interpenetração em “Y” na estação São Joaquim entre as linhas 1-Azul com a futura 6-Laranja, situação que inviabiliza operacionalmente a quebra de bitola, ou seja, implantação da bitola 1,43 m na linha-6 e manutenção da bitola 1,6 m na linha-1, o bom senso indica que a unificação de bitola é a solução óbvia e sensata, ou seja, a linha 6-Laranja deve ser construída em bitola 1,6 m, igual a da linha 1-Azul.

    Em outros cenários de traçado apresentados, as linhas 1 e 6 são independentes. Nesses cenários, a escolha da bitola da linha-6 deve seguir critérios econômicos ou operacionais. No caso da linha-6 independente da linha-1, a conexão e interpenetração entre ambas as linhas ocorreria na estação São Joaquim que seria a integradora. Entretanto, com base numa visão sistêmica e integrada para o Metrô SP, em que pese á divisão gerencial e operacional atualmente definida, com duas concessionárias distintas, a bitola larga de 1,6 m parece ser a mais adequada para a linha-6, para que haja a unificação de bitola, também nesse caso. Essa escolha é a mais conveniente em termos operacionais e econômicos, pois permite que seja deixado aberto um canal de comunicação entre as duas concessionárias, para possíveis parcerias nos investimentos em oficinas de manutenção, equipamentos de oficina para reparo de rodeiros, máquinas comuns de manutenção da via permanente, como niveladoras e alinhadoras, bem como para empréstimos e intercambio e racionalização de material rodante ou consórcios para aquisição de novos trens, com maior poder de negociação no mercado. Comprovadamente a unificação de bitola deve ser vista como uma grande vantagem competitiva e econômica para as concessionárias de ambas as linhas, pois produzirá grandes benefícios operacionais para os operadores do Metrô.

    A presente reflexão também permite a concluir de que a bitola não é um elemento determinante para a definição do traçado e das características construtivas de uma linha de Metrô. Além disso, os elementos aqui apresentados servem para demonstrar que é uma premissa equivocada a afirmação que os custos de construção em bitola 1,43 m são significativamente menores do que em bitola de 1,6 m.

    Em última análise, diante dos argumentos técnicos, econômicos e operacionais apresentados, pode-se concluir que a bitola mais adequada para a linha 6-Laranja é a bitola de 1,6 m, para ambos cenários possíveis, com a linha-6 independente ou com o compartilhamento entre as linha 1 e 6.
    O projeto básico da futura linha 6-Laranja esta previsto entre a estação São Joaquim linha-1Azul (1,6 m) cruzando as estações de Higienópolis / Mackenzie linha 4-Amarela, e Água Branca da CPTM com uma “possível” bifurcação em “Y” na estação Freguesia do Ó indo até a Brasilândia ou Cachoeirinha.
    Nota; Se for utilizado o mesmo padrão das linhas 1,2 e 3 (1,6 m) poderá ocorrer á integração e interpenetração em “Y” também na estação São Joaquim, caso contrario o transbordo é obrigatório nesta estação.
    Esta situação pode ser mudada, a não ser que a arrogância, intransigência e soberba dos gestores do Metrô SP mantenham a decisão de manter o projeto da futura linha 6 -Laranja divergente das existente linhas 1, 2 e 3 e trens suburbanos.

    Para mais detalhes e estudos comprobatórios veja a excelente matéria do prof. da UFRJ engº Marcus Quintella Cury http://www.marcusquintella.com.br, (Produção científica).

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  6. Defendo o uso de ferrovias de bitola padrão,1,43,5 paras as ferrovias do Brasil, visto que a maioria das ferrovias usam esse padrão, só que a Valec não vê isso como medida aceitável. Aroldo 02/3/2015.

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